Ampliar a receita a partir do maior aproveitamento dos ativos

Não é simples uma loja virtual de médio porte contar com processos eficientes e estáveis, ter experiência operacional e administrativa comprovadas (comercial e logística), dispor de uma plataforma de sistemas completa e confiável (site e back-office) e ter obtido a confiança de sua clientela. Dado que, de alguma forma, tudo isso tenha sido conseguido por uma loja virtual, que proveito adicional ao da venda de mercadorias esta loja poderá obter de sua vivência no comércio eletrônico? Explorar este difícil tema, longe de esgotar o assunto, é o objetivo deste artigo.

Como introdução ao assunto, é útil citar dois exemplos de aproveitamento de competências internas na geração de receitas adicionais:

  1. A Amazon, face ao elevadíssimo volume de processamento em tempo real não encontrou soluções de mercado para algumas de suas importantes demandas de TI, (performance no acesso ao banco de dados, ferramentas de análise de dados, etc.), por isso, foi obrigada a desenvolvê-las internamente e, com o sucesso, acabou por constituir uma empresa de TI separada oferecendo algumas de suas soluções para o mercado.
  2. De modo mais modesto, as soluções locais de Marketplaces pelas grandes lojas do varejo eletrônico constituem um aproveitamento de suas competências na captura de pedidos, análise de fraude e pagamentos. Na verdade, é uma variante de parte de sistemas preexistentes.

Para efeito de avaliação das possibilidades de receitas marginais, é importante ter em mente quais seriam os objetivos a serem atingidos a partir do uso do patrimônio físico e intelectual adquiridos. Entre os mais importantes, destacam-se: a ampliação da base de clientes, a diluição dos custos fixos pelo aumento do nível de atividade, o aumento da visitação e o aumento das vendas.

No texto, será usado o termo Fulfillment com a seguinte definição (um tanto abusiva): processo operacional integrado composto pelas atividades de recebimento e armazenamento de mercadorias, separação da mercadoria dos pedidos, faturamento, monitoramento da entrega e atendimento a clientes.

1. Vender com bandeira de terceiro – representantes virtuais

Há empresas cujas marcas são muito conhecidas e, pela natureza de seus negócios, não desejam se dedicar ao e-commerce, mas têm interesse em oferecer aos seus clientes alguma vantagem na compra de mercadorias através de sua intermediação. Para tanto, tal empresa pode fazer uso de um varejista virtual (loja-mãe) “patrocinando” uma transação de mercadorias por meio da sobreposição de seu logo ao site do varejista virtual que efetuará a venda. Com isso, o cliente da marca é beneficiado por ganhar um desconto, o varejista virtual “ganha” uma venda através do prestígio da marca e esta se beneficia com a fidelização do cliente.

Para explicar este modelo, é útil fazer uso de comparações entre os modelos abaixo descritos:

  • Franquia de loja física: modelo que dispensa explicações.
  • Loja física suportada por um grande distribuidor: o distribuidor passa a ser fornecedor único das mercadorias vendidas ao varejista, adicionalmente dando suporte administrativo e tecnológico ao varejista.
  • e-Commerce com logo de uma empresa possuidora de marca expressiva, ofertando mercadorias de uma loja virtual.

As diferenças mais importantes podem ser melhor observadas no quadro abaixo:

  Loja física Loja virtual
  Franquia Modelo A Modelo B
Logo Franqueador Varejista Marca local
Marketing Franqueador Varejista Marca local
Gestão Franqueado Varejista Não se aplica
Suporte administrativo Franqueador Distribuidor Não se aplica
Plataforma tecnológica Franqueador Distribuidor Loja-mãe
Capital de giro Franqueado Varejista Loja-mãe
Fulfillment Cliente final Cliente final Loja-mãe
Pagamento de royalty Sim Não Não
Benefício ao cliente Nenhum Nenhum Descontos

O cliente-alvo deste tipo de negócio não deseja ter sua própria loja por não ser varejista, deve ter grande credibilidade e ampla base de clientes. Para lojas virtuais de porte médio, os prospects seriam a marcas regionais fortes, pequenas lojas físicas que trabalham categorias similares, pessoas físicas dotadas com talento comercial (neste caso, com pagamento de comissão sobre venda). Uma variante deste modelo já está sendo usada para venda de mercadorias onde o contato pessoal é importante (cosméticos, bijuterias, produtos eróticos etc.).

2. Divulgar marca de terceiro

Um dos usos mais freqüentes da plataforma de venda virtual como serviço é “espaço personalizado na loja”. Trata-se da inserção do logo de uma marca na home da loja que “leva” o cliente a um espaço de compras onde somente constam mercadorias da marca escolhida.

Benefícios da loja virtual:

  • Ampliar portfólio com mercadorias de terceiros
  • Aumentar a visibilidade da loja
  • Obter receita pelos serviços de divulgação da marca, análise de fraude, processamento do pagamento, uso do marketing da loja etc.
  • Obter receita adicional de vendas como “representante” de uma marca

Benefícios da marca exposta na home:

  • Aproveitar-se da visitação da loja ampliando a abrangência da oferta de suas mercadorias.
  • Aumentar o volume de vendas, porém, não necessariamente com a mesma margem
  • Eximir-se da complexidade de ter sua própria plataforma de venda virtual abrindo mão de parte da margem

Neste modelo, entre outras, há duas formas operacionais mais comuns:

  1. Fulfillment a ser realizado pela própria loja virtual: as alternativas seriam o cross-docking (compra-se a mercadoria após ter sido vendida), a compra consignada (operação de controle tributário complexo) e a compra antecipada (com o benefício da entrega mais rápida, mas pressionando o investimento em capital de giro).
  2. Fulfillment a ser realizado pela marca que usa o espaço da loja: neste caso a loja virtual que expõe a marca teria a atuação semelhante a um Marketplace com todos os seus riscos. Apesar de mais tentador, este modelo esconde uma armadilha muito perigosa, pois, a loja iria patrocinar uma venda sem ter o controle do atendimento físico do pedido nem do processamento pós-venda com alto risco de imagem.

3. Alugar software da loja com possível uso do back-office

Este modelo inclui duas variantes: simplesmente alugar a loja e, além de alugá-la, responsabilizar-se pelo Fulfillment. Para ambos os casos, é essencial oferecer consultoria de marketing digital para promover o crescimento das vendas dos clientes por um novo canal.

Para uso deste modelo há duas condições estritamente necessárias:

  1. O software do site deve ter sido desenvolvido internamente, caso contrário o produtor não permitiria a sublocação, ser fácil de ser administrado e contar com serviços de análise de fraude e gateway para pagamentos.
  2. Contar estrutura física e de software para operar o Fulfillment com segurança.

Os clientes-alvo deste modelo seriam donos de marcas com experiência comercial e desejosos de entrar no e-commerce com suas mercadorias, porém sem conhecimento das complexidades deste canal de vendas. Para as pequenas lojas virtuais, os prospects seriam lojas físicas tradicionais e fabricantes, onde os proprietários têm consciência da importância do e-commerce e têm sido impedidos de usar este canal devido à barreira da tecnológica.

O simples aluguel da loja virtual existe há muito tempo. De forma abusiva, os fornecedores de software de site têm cobrado mensalmente um percentual da receita sem que haja razões para isso. Há oportunidade de mercado para oferta com outras formas de cobrança incluindo suporte mercadológico.

O modelo de aluguel da loja juntamente com o Fulfillment, em fase embrionária, está sendo oferecido ao mercado somente como plataforma tecnológica, sem as operações logísticas, portanto, com dificuldades no monitoramento da entrega e pós-venda.

4. Conclusões

  • O varejo eletrônico tem crescido muito fortemente em detrimento do varejo tradicional, portanto, não faltam oportunidades para aqueles que neles tiveram algum sucesso
  • Considerando que este canal tem notáveis diferenciações em relação ao varejo tradicional, o conhecimento, os ativos (sistemas, armazém, equipamentos etc.) e a vivência neste segmento constituem-se num valor passível de ser explorado
  • Uma das melhores oportunidades é usar a ociosidade mercadológica de terceiros patrocinando a venda de suas mercadorias.
  • Há marcas com grande potencial de venda nacional e que ainda não ingressaram no comércio eletrônico. A exposição da marca e a possibilidade da distribuição nacional de suas mercadorias pode ser realizada por meio de uma loja virtual bem constituída.
  • Das barreiras para o ingresso no comércio eletrônico, a tecnologia da informação é a maior delas. O aluguel da plataforma tecnológica seja esta parcial (somente o site) ou completa (incluindo o Fulfillment) reduz custos operacionais e facilita a entrada de empresas no segmento.
  • Receitas adicionais à operação de varejo implicam a venda de serviços, uma atividade bem diferenciada da venda de mercadorias. Os clientes deixam de ser os consumidores, passam a ser pessoas jurídicas gerando relações contratuais e atendimento específicos.

Fernando Di Giorgi – dezembro de 2013

Artigo publicado na edição 19 da Revista E-commercebrasil em fevereiro de 2014

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